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“Para cicatrizar, é necessário lavar e dói”, psicóloga fala sobre rede de apoio e ressignificação, entenda o que significam

16 de setembro de 2022 - Atualizado há 5 meses atrás
10 minutos de leitura

Por Redação 97

“Para cicatrizar, é necessário lavar e dói”, psicóloga fala sobre rede de apoio e ressignificação, entenda o que significam

Foto: Portal Cultura Sul FM

Ressignificar. Diante de tantas adversidades da vida, talvez a habilidade de dar um novo significado para o vivido seja uma boa competência para desenvolver. A certeza de que haverão vales (que parecerão um abismo) e picos (que parecerão eternos) é uma realidade imutável que constantemente nos testa. Resta, então, contar com a capacidade de ressignificar e de ser vulnerável frente às situações da vida.

A entrevistada desta semana, a psicóloga Vania Kwiatkowski Leal, discute sobre a prevenção do suicídio em adultos e reforça a necessidade de ressignificar o vivido e de construir uma rede de apoio.

De acordo com a psicóloga, uma das maiores dificuldades dentro de um caso de tentativa de suicídio por um adulto é o de ressignificar a situação que causou o sofrimento a ponto de levar o paciente a pensar em tirar a própria vida. Tal exercício exige o “mexer na ferida”, processo que causa sofrimento.

Contudo, a ajuda especializada permite, de acordo com a psicóloga, lidar com aquilo que aflige e verbalizá-lo, a fim de cicatrizá-lo. Ela reforça a dificuldade desse processo de ressignificação para o sujeito e para o profissional, uma vez que o psicólogo lidará com as questões mais sensíveis do outro, as quais jamais serão esquecidas, mas que precisam ser vistas de uma outra perspectiva, para que não continuem causando um sofrimento intenso.

“É como quando somos crianças, ralamos o joelho, temos um machucado aberto e, para cicatrizar, é necessário lavar; e dói.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

Quando questionada acerca dos fatores que acarretam o suicídio, a profissional informou que é a somatória de fatores biológicos, inclusive genéticos; socioambientais; culturais e psicológicos. É, portanto, o resultado de uma complexa interação. Por isso, não é uma situação isolada, mas sim o desfecho de uma série de acontecimentos que se acumulam ao longo da história da pessoa.

Quebra de sigilo

Segundo a psicóloga, a quebra de sigilo deve estar pautada no Código de Ética Profissional do Psicólogo, ou seja, deve acontecer de forma que se compreenda quais são as informações que devem ser encaminhadas, para quem encaminhá-las e como repassá-las.

“Estamos falando sobre a vulnerabilidade de um paciente adulto, com fatores de riscos para um suicídio, logo, para não haver ruptura do vínculo psicoterapêutico (profissional-paciente), a minha conduta é sempre ressaltar a importância da rede de apoio, conversar com o paciente sobre a possibilidade de orientação aos familiares ou amigos próximos. Nunca o contato com outrem é sem o conhecimento do paciente.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

Preconceito e tabu

Vania chama atenção para o indivíduo que não busca ajuda especializada, muitas vezes, motivada por um senso comum, como a ideia de que “quem vai ao psicólogo ou psiquiatra é louco”.

“Quando o paciente não entende a importância de colocar sua saúde mental em primeiro lugar, somente ele vai continuar sofrendo e não tendo qualidade de vida. Nós, enquanto profissionais, precisamos orientar, buscar maneiras de desmistificar o pensamento errôneo sobre saúde mental.” 

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

A profissional de saúde mental lamenta que, mesmo com toda a luta e avanço em relação à saúde mental, ainda há muito preconceito.

“As pessoas ainda não aceitam ter alguma situação relacionada a saúde mental, talvez pelo fato de não ser algo palpável/mensurável. Prefere-se procurar um clínico geral – ou outro especialista, como neurologista – que prescreva um medicamento para sanar um problema momentâneo a procurar um psicólogo ou psiquiatra e aceitar um possível diagnóstico que possa demandar acompanhamento de médio ou longo prazo.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

Espaço virtual e suas potencialidades

Para a psicóloga as redes sociais podem favorecer a normalização de se fazer psicoterapia e de ir a um psiquiatra.

Podcasts, tiktokers, enfim, os meios que permitem que os profissionais possam aproximar os assuntos da população de uma maneira rápida e informal, como o espaço que a Rádio Cultura Sul FM abre para os profissionais conversarem e trazerem assuntos sérios para discussão e outros espaços mais formais para informar. Todos são de extrema importância para desmistificar e quebrar o tabu a respeito da nossa saúde mental, pois saúde mental é nossa saúde física. Nosso corpo fala.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

De acordo com a psicóloga, a internet só é um espaço saudável quando não há comparação com o outro, quando se utiliza como um meio de se expressar, quando se busca conhecimento nas fontes corretas, quando se aproxima de quem ou do que está distante.

Entretanto, quando não há limite no tempo “online”, quando a vida se torna apenas o espaço virtual e quando se tem a necessidade de expor para o outro o que gostaria de ser, então, tem-se um alerta de que é preciso buscar ajuda.

Rede de apoio: o que é e como construir?

A psicóloga clínica descreve que rede de apoio é a união de pessoas que tem o objetivo de dar segurança para a pessoa em sofrimento, não deixar que a pessoa fique em perigo ou se sinta sozinha.

“São pessoas que podem auxiliar a “não deixar a peteca cair”, estão sempre dispostas a socorrer e criar vínculos e laços. Diferente da ajuda que é um auxílio momentâneo.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

Para construir uma rede de apoio, segundo a profissional, é preciso entender que as pessoas são diferentes. “Um não pensa como o outro e não é porque eu não concordo com fulano que ele tem que se modificar para me agradar”, diz Vania.

Para ela, essa relação se apoia no respeito e na convivência. Juntas, elas farão o sujeito se sentir pertencente, promovendo segurança.

“O vínculo é de extrema importância na rede de apoio. Como é um grupo de pessoas que estão dispostas a ajudar de maneira constante, essa ajuda NÃO deve ser de maneira nenhuma jogada na cara posteriormente. Sendo assim, se a pessoa tem uma rede de apoio, se ela se sente pertencente, importante, se ela tem com quem contar, então, essa rede de apoio, ao perceber uma ideação ou tentativa de suicídio, deve acolher, falar sobre, verbalizar para o sujeito o quão importante ele é, o quanto se preocupa e orientar para que ele procure ajuda especializada.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

Papel da sociedade

Além disso, para a psicóloga, falar sobre saúde mental em todos os espaços é fundamental, assim como mobilizar a sociedade civil para esse problema, exigindo políticas públicas que tratem sobre esse assunto.

Foto: Arquivo pessoal de Vania Kwiatkowski Leal

“Quando promovemos saúde, prevenimos suicídio. Onde atuo no SUS, temos atividades desenvolvidas pelo nosso comitê há alguns anos, porém elas pararam devido à pandemia. Agora estamos retornando. É importantíssimo que a sociedade ocupe o espaço que lhe é de direito e que contribua para tais atividades, pois a prevenção ao suicídio e a promoção de saúde é responsabilidade de todos.”

Vania Kwiatkowski Leal para a redação do Portal Cultura Sul FM

Recomendações da profissional

Vania elencou algumas orientações para quem está passando por algum momento delicado, assim como para os familiares que precisam lidar com parentes em sofrimento, confira.

  • Não tente ser forte sozinho;
  • Não ache que procurar ajuda é ser fraco;
  • Não tenha vergonha de buscar ajuda especializada;
  • Todos nós temos problemas e fragilidades, encarar nossos monstros com ajuda adequada é necessário.

Para familiares:

  • Aceitar que nosso ente querido tem fragilidade, monstros e sofrimentos;
  • Aceitar que nós não somos perfeitos, que não temos poderes, que não somos culpados de tudo, mas que sim, temos responsabilidades, e que quem amamos precisa de ajuda especializada, talvez de medicamento e acompanhamento de psiquiatra, de psicólogo para manter sua saúde mental.
  • De forma geral, aceitação, acolhimento, respeito e segurança são fundamentais.

Sobre a entrevistada:

Vania Kwiatkowski Leal é formada em Psicologia pela Universidade do Contestado (UNC) e pós-graduada pela Universidade Estadual do Centro Oeste (Unicentro). É psicóloga clínica na Clínica Saúde em Movimento em São Mateus do Sul desde 2014 e na Prefeitura de Antonio Olinto (SUAS/SUS) desde 2017.

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